Todo ente, isto é, tudo quanto é real ou na medida em que pode ser real), se diz também um, verdadeiro e bom.
Esses conceitos são o que a tradição filosófica medieval denominou “atributos transcendentais” ou simplesmente “transcendentais”.
São atributos porque estas “propriedades” sempre acompanham tudo aquilo que é. Em outros termos, todo ente, pelo simples fato de ter o ser, possui também unidade, verdade, bondade, beleza, realidade e aliquidade de modo análogo a como todo homem, pelo simples fato de ser homem, possui a capacidade de rir.
Esses atributos são, ademais “propriedades transcendentais” por oposição às “propriedades categoriais”. Por propriedade categorial entende-se aqueles predicados exigidos pela essência do sujeito e, portanto, referidos necessariamente a ele, sem que o sujeito mesmo esteja incluído no conceito ou essência do predicado. Por exemplo, a capacidade de rir se diz necessariamente do homem, mas sem significar sua essência.
Em suma, nas propriedades categoriais há uma distinção real entre o sujeito e aquilo que lhe vem atribuído. As propriedades transcendentais, porém, não adicionam nada realmente distinto do ser, pois o que haveria de distinto fora do ente que lhe pudesse ser atribuído (fora do ser só há o nada ou o não ser). Ao contrário das propriedades categoriais, as transcendentais se incluem necessariamente em seu sujeito, por isso os escolásticos costumavam dizer que “o um, o verdadeiro e o bom são intercambiáveis com o ente” (Ens, et unum, verum bonum convertuntur").
É por isso que tais noções são transcendentais: elas perpassam todas as categorias e abarcam os mesmos itens que a própria noção de ente, adicionando apenas distintas cargas cognitivas. São como diferentes pontos de vista a través dos quais compreendemos melhor a realidade. Do ponto de vista da lógica, os transcendentais promovem um aumento da compreensão da realidade sem uma diminuição de sua extensão.
No caso dos termos categoriais, quanto maior for a sua compreensão, menor será a sua extensão, ou seja, seu conceito abrangerá menos itens. Por exemplo o termo “animal” abarca todos os seres vivos com sensibilidade. Quando determinamos este conceito adicionando a diferença “racional”, concebemos de maneira mais determinada a realidade que estamos apreciando e, como contra partida, se deflaciona a extensão de seu conceito. Somente o homem está sob a noção de “Animal racional”; dele se excluem o gato, o cavalo, o cachorro, etc.
Em suma, nas propriedades transcendentais, temos o mesmo sentido com diferentes referências de modo parecido a como o mesmo planeta Vênus se denomina “Estrela d’Alva” quanto avistado pela manhã e “Estrela da Tarde” quando o vemos ao anoitecer.
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